Medição de Biopotenciais - o
Estado da Arte
Área 2 - Instrumentação Física
2013/1
Leonardo Sehn Alves
Prof: Rafael Pezzi
1. Introdução
2. Conceitos Gerais
Medição de campos EM
Medição de Biopotenciais
Origem dos Biopotenciais
3. Principais tipos de
Biopotenciais
ECG
EEG
EMG
EOG
4. Princípios fundamentais
5. Otimização da Medida
Eletrodos
Amplificadores
Circuito
Redução de Interferência elétrica
Filtragem
Eliminando erros
Isolamento elétrico
Proteção de Defibrilamento
6. Práticas de Medida
7. Estado da Arte
8. Conclusão
1. Introdução
Medir campos eletromagnéticos
pode parecer absolutamente corriqueiro - afinal estamos embebidos neles o tempo
todo - e trivial frente outras grandezas que devem primeiro ser convertidas
para um sinal elétrico para então serem interpretadas, mas e se a fonte do
sinal elétrico a ser medida for você mesmo? O ser humano é uma fonte rica e
complexa de sinais elétricos devido a atividade celular dos mais diversos
sistemas do corpo, e como qualquer medição tem o propósito de uma compreensão
maior daquilo que se está medindo, e nesse caso em específico o apelo é ainda
maior, pois estamos falando da compreensão do ser humano como sistema, a nossa
autocompreensão. Quando se fala em ser humano, a complexidade é um ingrediente
quase indispensável, mas com ela vem também a riqueza, a variedade. Existem 4
tipos principais de biopotenciais a serem medidos em um ser humano e os sinais
de cada um são: o eletrocardiograma, o eletromiograma, o eletrooculograma e o
eletroencefalograma.
Neste trabalho, será feita uma
abordagem sobre esses 4 potenciais, principalmente para que se entenda o que é
geral - ou fundamental - quando se trata de biopotenciais e o que são as
particularidades de cada um dos casos. Veremos que a amplitude do sinal emitido
é uma característica que varia para cada tipo, sendo o sinal do
eletroencefalograma – emitido pela atividade cerebral – o mais sutil de todos e
portanto o que precisa de um maior refinamento para ser medido. Com esse quadro
em vista, percebemos que quando se fala em estado da arte da medição de
biopotenciais estamos tratando de eletroencefalografia. E, embora o método seja
basicamente o mesmo para a obtenção de qualquer eletroencefalograma, existem
diversas particularidades a serem cuidadas quando temos um sistema tão complexo
como o ser humano, como a construção dos eletrodos, disposição geométrica dos
mesmos, amplificação de sinal, isolamento para medição e segurança da “amostra”
(defibrilamento). O enfoque desse trabalho é abordar e explicar, dentro de um
limite razoável de profundidade, todos esses aspectos que podem aprimorar a um
nível de fronteira a medição de um biopotencial sutil e valioso como o de um
eletroencefalograma.
2. Conceitos Gerais
2.1 Medição de Campos
Eletromagnéticos
De maneira geral, campos
eletromagnéticos são medidos por sensores ou sondas chamados medidores EMF
(eletromagnetic field) que são basicamente antenas – umas haste de metal onde
os elétrons são livres para oscilar e sensível à frequência incidente – com
características particulares para evitar reflexão e acoplamento (dc ou ac), ou
seja, não interferir na medida. Existem dois tipos de medidores: os de banda
larga, que abrangem um largo espectro de frequências, e os de frequências
seletiva, que o medidor é configurado para uma faixa de frequências específica.
Podem ser uniaxiais ou triaxiais,
que fornecem as três componentes do campo, e também podem possuir sistemas
ativos que amplificam o próprio sinal, porém esses sistemas ativos tendem a
aumentar o tempo de resposta.
Os monoaxiais devem rotacionar-se
em três direções perpendiculares para obter a correta a amplitude do campo, os
triaxiais (mais caros e práticos) resolvem este problema por sua geometria e na
realidade a medida é realizada em três diferentes instantes de tempo e está
suposta a estaticidade do campo. Tipicamente estão configurados para 50 ou 60
Hz, pois pretendem obter o campo eletromagnético do ambiente em que estão e
portanto a frequência da rede de abastecimento é a mais provável de ser
detectada.
2.2 Medição de Biopotenciais
Ao contrário de medidores EMF,
medidores de biopotenciais não pretendem medir o campo eletromagnético em que o
ambiente está embebido e sim o campo eletromagnético produzido pela atividade
de diferentes sistemas do corpo. O princípio de utilizar um condutor que seja
sensível às oscilações eletrônicas e iônicas provocadas por campos
eletromagnéticos é mantido, mas nesse caso o campo a ser medido é o produzido
pela atividade celular de diferentes sistemas e sérios esforços para evitar que
o campo proveniente da rede de abastecimento interfira nessa medição são
realizados.
Existem 4 tipos de biopotenciais:
o Eletrocardiograma (ECG), o Eletroencefalograma (ECG), o Eletromiograma (EMG)
e o Eletrooculograma (EOG). Cada um corresponde, respectivamente, ao biopotencial
emitido pelo coração, cerébro, músculos e movimento dos olhos. São adquiridos
com eletrodos específicos que realizam a interface com o órgão ou corpo e
transducionam sinais sem ruído e sem distorções (“artifact-free” utilizado na
literatura em inglês). O projeto de um amplificador de biopotenciais
corresponde ao de um amplificador de instrumentação, que será tratado em mais
detalhes futuramente; esse amplificador deve possuir várias características
particulares: como alta impedância de entrada, alta amplificação e baixa
interferência elétrica. Sistemas auxiliares podem ser utilizados para melhor
isolamento elétrico e proteção a choque de defibrilamento e de oscilações da
própria rede ou do aparelho ao qual o medidor está associado. Aspectos a serem considerados
na medição de biopotenciais são a preparação da pele, posicionamento de
eletrodos e bom isolamento elétrico.
Os biopotenciais podem ser
associados a atividade elétrica em nível celular, potenciais causados pela
diferença de concentração de íons no interior e no exterior da célula. O
gradiente de concentração eletroquímica através da membrana semipermeável da
célula gera o potencial de Nernst, que é causado pela grande concentração de
íons K+ no interior e Na+ no exterior, esse é o potencial de repouso. Algumas
células são excitáveis e causam o potencial de ação, que resulta de um fluxo
intenso de íons através dessa membrana em resposta a um estímulo elétrico ou
transiente de carga sobre essa célula. A excitação de células, correspondente à
atividade de cada um dos sistemas citados anteriormente, gera corrente no
volume condutor do seu entorno se manifestando como potencial no corpo.
Algumas características
relevantes dos biopotenciais são a baixa amplitude (10 μV a 10 mV) e espectro
de frequências de baixa amplitude (dc a 100 Hz). Alguns dos problemas notáveis
para a medição desses potenciais são a interferência biológica (pele, eletrodo,
movimento) e o ruído externo como mencionado anteriormente (linhas de força,
radiofrequências). Os desafios para a medição de cada um dos tipo de
biopotenciais serão extensamente abordados neste texto.
2.3 Origem dos Biopotenciais
2.3 Origem dos Biopotenciais
Os biopotenciais são causados
fundamentalmente por atividade celular, em particular na sua organela mais
externa: a membrana plasmática. A membrana plasmática já se comporta por si só
como um capacitor devido a distribuição assimétrica de carga na forma de íons
difusíveis ou não dos dois lados da membrana, a parte externa e o citoplasma.
Isso confere um potencial de repouso não-nulo às células excitáveis e às
não-excitáveis, além disso temos potenciais de ação e eletrotônicos sendo
transmitidos eventualmente nas células excitáveis, retirando-as da sua situação
de repouso. Esses diversos potenciais combinados somados ao longo de diversas
células formam os biopotenciais, que são medidos de maneira incidental nas
técnicas de medição não-invasivas que implementamos.
É preciso ter em mente que os
condutores de carga nesse caso são íons (não há presença de elétrons livres
como em um condutor), difusíveis ou não, que atravessam a membrana através de
canais iônicos ou carreadores de maneira passiva ou ativa (com gasto de ATP). O
citoplasma é genericamente negativo com relação ao exterior da célula devido à
presença de proteínas muito grandes não-difusíveis no interior da célula. Os
outros principais íons na atividade celular são o K+, o Na+ e o Cl-.
Essas proteínas são
não-difusíveis e os outros íons não são completamente difusíveis pois a
membrana plasmática é formada por uma bicamada fosfolipídica mantida pelo
efeito hidrofóbico e com interior apolar que evita trânsito livre de solutos
polares, como os íons. Mas existem canais seletivos (em formas de proteínas
transmembrana, encravadas nessas membranas) que permitem a passagem de alguns
desses íons. E porquê então os íons K+, como os mais numerosos nas células, não
difundem, através desses canais, todos para o interior da célula
neutralizando-a? O que ocorre é que uma parte dos íons K+ fica do lado de fora
da célula devido a uma baixa concentração dos mesmos nessa região (a difusão
respeita as Leis de Fick). Isso se deve ao gradiente químico, que juntamente
com o gradiente elétrico define a concentração de uma espécie de íon difusível
dos dois lados da membrana no equilíbrio, esse equilíbrio é chamado equilíbrio
de Gibbs-Donnan, com potencial resultante descrito pela equação de Nernst:
Equação de Nernst
Eq. de Nernst
onde R é a constante universal
dos gases, T é temperatura em Kelvin, z é a carga de valência do íon, F é a
constante de Faraday (96.485 C/mol) e dentro do logaritmo temos a razão da
concentração da espécie do íon no exterior da célula pela mesma no interior.
Essa é a situação, com este potencial, verificada em células não-excitáveis, ou
seja, aquelas que não sofrem potencial de ação. Os íons K+ se localizam
principalmente no interior da célula, enquanto o Na+ e o Cl- se localizam
principalmente no exterior, e são difusíveis pela presença de canais
específicos para a sua espécie. Ocorre um acúmulo de proteínas aniônicas no
limiar interno da membrana plasmática (que difundiriam se fosse possível) e um
acúmulo de K+ no limiar externo da membrana devido ainda a atração dessas
proteínas, o que confere aquele caráter de capacitor mencionado anteriormente.
Nas células excitáveis, outras
espécies de íons também são difusíveis, o Na+ e o Cl-, e a difusividade de cada
íon será dada pela quantidade de canais específicos de cada espécie (como regra
o potássio é mais difusível, por haver mais canais específicos para a sua
espécie). Essas células apresentam uma situação de não equilíbrio, pois o K+
tenderia a ser substituído gradualmente pelo Na+ até que não houvesse excedente
de nenhuma das espécies em nenhum dos dois lados, mas isso não ocorre, e essa
situação é financiada pelas bombas Na+,K+ATPase que através de carreadores
mandam íons K+ para dentro e Na+ para fora através do gasto de ATP. O potencial
de repouso nessas situações é calculado pela equação de Goldman-Hodgkin-Katz,
que é uma generalização da equação de Nenst para mais espécies de íons
difusíveis:
Equação de GHK
Eq. de GHK
onde P é a difusividade para cada
espécie. O motivo de um sistema tão complexo para manter um potencial de
repouso nessas células excitáveis, como os neurônios e células musculares, tem
a ver com o fato de elas serem excitáveis. É evidente que o Na+ tem dois bons
motivos para entrar na célula, o gradiente químico e o elétrico, e se ele pudesse
o faria com avidez, mas ele é muito menos difusível que o potássio e existe a
ação das bombas de carreadores o enviando para fora o tempo todo. Pois existem
mecanismo que podem aumentar subitamente a difusividade do Na+, os canais com
portão (CCPs), que são ativados por molécula transmissora ou por tensão
transmembrana (característica auto-sustentável da perturbação) e se esses
canais são abertos, os Na+ entram de maneira tão intensa que podem chegar a
inverter a DDP na célula.
O que define o comportamento do
sinal ativo transmitido através das células é a intensidade da tensão aplicada,
mais especificamente, se ela supera ou não a tensão de limiar para o processo
de um potencial ativo. Se a tensão de limiar não for superada, apenas alguns
CCPs de Na+ serão abertos e imediatamente serão fechados, esses canais tem essa
cinética rápida por serem feitos em duas etapas (ativação e inibição). Esse
sinal é simétrico e chamado de eletrotônico ou sináptico, por ser o potencial
ativo presente nas reações sinápticas que se propagam através dos dendritos e
frequentemente associados a fenômenos neurológicos interessantes como memória e
aprendizado.
No entanto, se a tensão de limiar
for superada, diversos CCPs de Na+ são abertos e eles produzem uma
despolarização tão intensa da célula que inverte o sinal da mesma atingindo o
pico de ultrapassagem, esses canais são rapidamente fechados devido a natureza
do canal e pela intensidade do fenômenos. Logo em seguida começa o fenômeno da
repolarização pela abertura de CCPs de K+ que os enviam para fora da célula em
conjunto com a atividade das bombas, esse processo é mais lento pois os CCPs de
K+ são mais lentos para se abrirem e fecharem por serem feitos de só uma etapa,
e devido ao desbalanço de gradiente químico ainda ocorre uma situação idêntica
a de repouso, seguida de uma situação de hiperpolarização, antes de se obter o
repouso em definitivo. Esse potencial intenso e assimétrico descrito acima é o
chamado potencial de ação, e é importantíssimo para uma transmissão fidedigna
de informação por longas distâncias, como no axônio por exemplo, pois os
potenciais sinápticos são decrementais. Entre o pico de ultrapassagem e o ponto
de máxima hiperpolarização temos o período refratário em que novas excitações
não são possíveis, esse aspecto tudo-ou-nada dos potenciais de ação são
essenciais (como veremos).
Nos neurônios, o potencial de
ação atinge a região pré-sináptica abrindo CCPs do íon Ca++ provocando alguns
comportamentos, como a mobilização e exocitose de vesículas com neurotransmissores
específicos do tipo de neurônio em questão, e esses neurotransmissores são
enviados através da fenda sináptica atingindo moléculas com as quais tem
afinidade na porção pós-sináptica, esses receptores podem ser canais iônicos ou
outros mediadores de transdução transmembrana, que causam uma variação no
potencial elétrico (de comportamento inibitório ou excitatório) que normalmente
se apresenta como potencial sináptico que tende a se somar com outros
potenciais sinápticos na árvores dendrítica.
Esses potenciais são importantes
para codificação (além de sua função neurológica já mencionada antes) devido a
sua proporcionalidade com o sinal que as causou, e também por funcionarem como
sinais de entrada que se somam e causam uma excitação que provoca um potencial
de ação na “região de engatilhamento” no começo do axônio. Esse potencial de
ação, essencial para propagação de longas distâncias, se propaga através da
abertura de CCPs de Na+, que vão invertendo a DDP na membrana plasmática ao
longo do axônio através da abertura de novos canais de Na+, e assim de forma
auto-sustentável ao longo de todo o axônio até atingir os telodendritos (não se
propagam de maneira retrógrada devido ao período refratário). O que está sendo
propagado não é uma corrente iônica longitudinal e sim uma perturbação
transmembrana auto-sustentável.
Quando falamos de axônios
não-mielinizados toda a superfície do axônio deve ser invertida, o que requer
uma quantidade enorme de canais (proteínas), de bombas Na+,K+ATPase, o que requer
muita ATP e portanto mitocôndrias, o que faz que neurônios desse tipo sejam
muito grandes (como o da lula gigante, de papel inicial para primeiros estudos
nessa área). A mielina permite que o potencial de ação seja transmitido
saltadamente, pois na região da mielina correntes iônicas longitudinais são
realmente conduzidas, sendo apenas nas regiões dos nodos de Ranvier que o
processo de excitação ocorre em regiões de intensa concentração de CCPs e
bombas, o que facilita a propagação. Esse mecanismo evolutivo permitiu não só
uma maior velocidade de propagação, mas também uma miniaturização dos neurônios
(menor necessidade de proteínas), o que permitiu colocar mais neurônios em um
mesmo espaço, o que permite conexões mais complexas e intrincadas, e consequentemente
comportamentos mais sofisticados, e esse simples mecanismo pode ter sido a
causa (ou parte dela) da grande inteligência desenvolvida pelos seres humanos.
Essas situações descritas até
agora são situações neuronais unitárias ou multiunitárias (poucos neurônios) e
por não apresentarem padronização são de baixo apelo em diagnóstico, em que o
EEG (eletroencefalograma) é mais apreciado, por conseguir refletir melhor o SNC
(sistema nervoso central) ou subsistemas do mesmo e por apresentar sinais
facilmente padronizáveis, com relação com atividades funcionais do sistema ou
dos subsistemas. São chamados potenciais de campo por abrangerem muitos
neurônios e podem ser DC (pequenas flutuações) ou AC (oscilações intensas). O
EEG é uma medida extracelular não-invasiva, obtida sobre o couro cabeludo, o
que só foi possível após certa sofisticação da eletrônica. Permite observar
comportamentos de alerta/vigília, excitação/estresse, sonolência, sono,
epilepsia e coma, através de diferentes padrões do sinal elétrico medido.
Os fortes candidatos a
responsáveis pelas ondas do EEG são os neurônios piramidais: devido a amplitude
do sinal elétrico observado, por serem as maiores células excitáveis do SNC,
por se comunicarem utilizando o glutamato (ativador de CCP de Na+ excitatório e
principal neurotransmissor do SNC) e por suas sinapses serem palco dos
principais eventos plásticos estudados atualmente, como a LTP e a LTD, fenômenos
subjacentes de funções encefálicas como aprendizado e memória. Os neurônios
piramidais permitem amplificação de correntes sinápticas em função de suas
múltiplas “zonas de gatilho” e as poderosas sinapses inibitórias de seus
interneurônios vizinhos permitem enormes potenciais inibitórios. Além disso
minúsculos pós-potenciais de alta frequência possibilitam ondas de até 100 Hz.
E as células gliais contribuem com mudanças elétricas passivas.
Em suma, eventos intracelulares
geram correntes iônicas no meio extracelular e que, por sua vez, se somam
algebricamente de maneira linear, essas correntes em conjunto com uma profusão
de potenciais sinápticos nos espinhos dendríticos contribuem para fazer emergir
os padrões oscilatórios do EEG. Portanto, o EEG é o registro incidental das
correntes extracelulares associadas a atividade somada de várias células
individuais.
3. Principais tipos de
Biopotenciais
3.1 Eletrocardiograma (ECG)
Sinal proveniente da atividade
cardíaca, é o mais intenso do biopotenciais produzidos no corpo (amplitude da
ordem de alguns mV), e possui um padrão que traduz a contração e relaxação
periódica do músculo do coração (como observa-se na figura abaixo). É tomado
como o exemplo básico de biopotencial e quando falamos de maneira genérica, toma-se
o ECG como base.
Figura 1: Sinal característico de
um ECG, com alguns processos biológicos associados. Créditos: Fonte 4
O sinal é obtido posicionando
conectores no dorso, nos braços e nas pernas. Um sistema amplamente usado e
aceito é o de 12 sondas (figura abaixo) em que temos uma sonda em cada braço e
1 em cada perna, a direita como referência, e outras seis vão conectadas no
peito do sujeito. As sondas de membros são denominadas sondas I, II e III. As
sondas precordiais VR, VL e VF são derivadas dos sinais dos membros. As seis
restantes são sondas de peito V1 a V6 (nomenclatura do sistema).
Figura 2: Sistema padrão de
disposição de sondas para medição de ECG. Fonte: Wikipédia
Como o sinal na superfície da
pele é de baixa amplitude, ele é suscetível a distorções, causados por
movimentos de músculos e da pele, e que devem e podem ser minimizados pelo uso
de conectores adequados como os revestidos de prata (Ag) com cloreto de prata
(AgCl) ou com sinterizados de Ag-AgCl. Um gel eletrolítico deve ser usado para
melhorar a condução do eletrodo com a pele. Além disso, como esses ECG são
usados em situações críticas, devem ser isolados eletricamente por segurança e
protegidos de altas voltagens, e com bom tempo de recuperação, produzidas por
defibrilamento ou oscilações da rede ou do equipamento acoplado ao medidor.
Duas aplicações características
de amplificadores de ECG são em instrumentos como marca-passos e
defibriladores.
3.2 Eletroencefalograma (EEG)
É o biopotencial mais tênue e
complexo existente, tem como características marcante a baixíssima amplitude
(ordem de microvolts), portanto eletrodos banhados a ouros são colocados
diretamente no escalpo para um contato de muito baixa resistência (impedância).
Um sistema de posicionamento do
eletrodos, chamado 10-20 sondas (10-20 probes, figura abaixo) é utilizado com
boa aceitação. Como reflete a ação de milhões de neurônios, é extremamente
difícil de ser interpretado, pois inclui sinal do tecido cerebral, do fluido e
do escalpo. Porém alguns comportamentos podem ser interpretados através da
modificação do comportamento da onda e principalmente através da modificação
das frequências emitidas, que podem traduzir os diferentes estados do sono e
eventuais patologias associadas ou uso de medicamentos.
© 2007 .. 2008 Soft-dynamics.de
Figura 3: Sistema
internacionalmente adotado para realização de EEG simples. Créditos: © 2007 ..
2008 Soft-dynamics.de
Como é o sinal mais sutil,
normalmente refere-se às dificuldades de obtenção de sinais de biopotenciais quando
se fala nele, embora as dificuldades sejam presentes em todos os casos, mesmo
que nesse elas sejam mais determinantes. Os maiores desafios para uma boa
obtenção de sinal são as fontes de ruídos fisiológico, ambiental e eletrônico.
Os fisiológicos são distorções de
movimento, ruído muscular, do movimento dos olhos e até mesmo de batida do
coração. As eletrônicas são as linhas de força (60Hz), indução eletromagnética
e radiofrequências. Além disso, componentes eletrônicos do próprio amplificador
podem aumentar o ruído. Bons design e técnicas de medição podem mitigar os
efeitos de ruídos e interferências.
3.3 Eletromiograma (EMG)
Menos popular e de comportamento
diferente (não-periódico) dos anteriores. Um sinal elétrico é produzido quando
um músculo se contrai, esses sinais são de alta frequência e podem prover
alguma informação sobre a força exercida pelo músculo.
Podem ser medidos, por exemplo,
com 4 eletrodos, 2 nos bíceps e 2 nos tríceps (figura abaixo), nesse caso sem
referência, e esses eletrodos podem ser dos tipos revestidos de prata ou
banhados a ouro para uma melhor medição, mas podem ser usados eletrodos de
ferro inoxidável mais baratos. Como o sinal é de mais alta frequência e
amplitude, é menos suscetível a distorções devido ao potencial da pele ou a
movimentos. Esse fator pode ser reduzido ainda filtrando o sinal de frequências
abaixo dos 20 Hz com um passa-alta.
Figura 4: Ilustração de uma
maneira típica de obter EMG. Créditos: Fonte 5
3.4 Eletrooculograma (EOG)
O movimento dos globos oculares
no ambiente condutor do crânio gera um campo elétrico. Pode ser pensado como um
dipolo se movimentando e produzindo um sinal, que pode ser usado para
identificar a movimentação dos olhos e disfunções na mesma. Possui baixa
amplitude (10 – 100 μV) e baixa frequência (essencialmente DC a 10 Hz),
portanto se faz imperioso o uso de amplificadores com alto ganho, boa resposta
a baixas frequências e estabilidade DC. A combinação eletrodo-gel deve produzir
baixos níveis de potencial de junção, poucas distorções de movimento e pequeno
desvio no sinal DC, isso em conjunto com o nível de segurança que se deve ter
com eletrodos próximos aos olhos faz com que eles sejam de baixa vida útil. Os
eletrodos são posicionados acima e abaixo dos olhos e dos dois lados de ambos
(figura a seguir).
Figura 5: Mapeamento da diposição
d eletrodos na face para um exame de EOG. Fonte 6
4. Princípios da Medição de
Biopotenciais
Um estudo completo de eletrodos
que se ajustem a cada um dos casos citados acima, bem como considerações de
filtragens e de amplificações em determinada faixa de frequências deve ser
feito. Essas técnicas e cuidados serão abordados posteriormente, são 3 os
princípios fundamentais e genéricos na medição de qualquer biopotencial e que
devem ser sempre levados em consideração, são eles:
Projeto (design) dos eletrodos e
ligação condizentes com a aplicação desejada;
Projeto do circuito do
amplificador para amplificação condizente do sinal e rejeição de ruídos e
interferências;
Boas práticas de medição para
mitigar efeitos de distorções, ruído e interferência.
5. Otimização da Medida
5.1 Eletrodos
Existem diferentes tipos de
eletrodos que se adequam melhor a um tipo de medida ou ou a um projeto em
específico. Examinaremos agora os tipos de eletrodo de maior destaque caso a
caso.
Figura 6: Ilustração da região de
contato entre eletrodo e a pele e a eletrônica envolvida
Figura 6: Ilustração da região de
contato entre eletrodo e a pele e a eletrônica envolvida. Créditos: Fonte 2
5.1.1 Prata e Prata/Cloreto de
Prata
São os eletrodos que possuem os
mais baixos e estáveis potenciais de junção. Potenciais de junção são causados
pela interface de duas superfícies eletroliticamente diferentes, e são
causadores de distorções da medida na movimentação de eletrodos. Compostos de
prata no interior revestidos de cloreto de prata ou então sinterizados de prata
e cloreto de prata, são utilizados com gel composto de cloreto de sódio ou de
potássio para produzir uma boa condutividade e baixo potencial de junção.
Bastante utilizados para obter eletrocardiograma.
5.1.2 Banhados a Ouro
Eletrodos banhados a ouro são
bons condutores e inertes. Produzidos em formatos pequenos para serem usados em
EEG sendo presos no escalpo (colados de preferência onde não há cabelo) e com
espaço para conter o gel condutor pelo formato produzido (formato de “copo”, há
um certo volume entre o eletrodo e a pela), tem como desvantagem potenciais de
junção mais altos (do que os de prata-cloreto de prata) e maior custo.
Figura 7: Colocação de sondas
desse tipo em exames de EEG
Figura 7: Colocação de sondas
desse tipo em exames de EEG. Créditos: Fonte 2
5.1.3 Polímeros Adesivos
É interessante desenvolver
eletrodos que já sejam adesivos por si só, portanto alguns são feitos com
polímeros que têm essa propriedade e que podem ser condutores se forem
introduzidos íons metálicos em sua estrutura. Recobertos com uma camada
metálica de alumínio ou prata na parte externa para fechar o contato, esses
eletrodos possuem grande resistividade e não são recomendados para sinais de
alto ruído ou suscetíveis a erros de medida por movimento. Têm como vantagem o
seu baixo custo.
Figura 8: Estrutura de um
eletrodo de polímero adesivo
Figura 8: Estrutura de um
eletrodo de polímero adesivo. Créditos: Fonte 2
5.1.4 Agulhas
Na verdade essa categoria se
distingue mais pela geometria e pela técnica de medição, que é invasiva, ou
seja, colocada dentro do corpo. Esse eletrodo invasivo é utilizado apenas
quando é absolutamente necessário obter o sinal do órgão em si. Conseguem captar
potenciais bem baixos e são utilizados tipicamente em músculos, com uma agulha
feita de aço. Para fins de pesquisa podem até mesmo ser utilizados diretamente
no músculo cardíaco.
5.2 Amplificadores de
Biopotenciais
Biopotenciais exibem baixa
amplitude e frequência e são prejudicados por ruído biológico e do ambiente. As
considerações de projeto levam em conta alta impedância de entrada,
amplificação apropriada e largura de banda, estabilidade ante flutuações de
tensão e temperatura. A chave para a aquisição de biopotenciais é o
amplificador de instrumentação. Cada tipo de biopotencial requer uma
especialização nos amplificadores de instrumentação.
Figura 9: Conexão entre eletrodo
e amplificador diferencial (esquemático)
Figura 9: Conexão entre eletrodo
e amplificador diferencial (esquemático). Fonte 2
5.2.1 ECG:
Podem ser construídos a partir de
um amplificador de instrumentação simples com filtros ativos para frequências
abaixo de 0.05 Hz e acima de 100 Hz adicionados normalmente. O isolamento elétrico
é essencial, pois mesmo vazamentos de correntes de 10 μA podem ser fatais
devido a conexões de baixa ou alta resistência diretas ao coração. Com isso,
isolando da rede e do terra da terra, evitando passagens de corrente em
situações normais ou de falhas razoáveis. Esse isolamento é obtido através de
acoplamentos ópticos ou por transformadores, lembrando que esses designs devem
preservar a linearidade da amplificação. O circuito deve ser protegido contra
defibrilamentos.
5.2.2 EEG:
Deve ser adaptado para lidar com
sinais muito baixos, provendo um altíssimo ganho. Deve ser desenvolvido com um
cuidado para que os componentes produzam baixo ruído térmico e eletrônico
(tensão e corrente). Também deve possuir um sistema de isolamento elétrico
anti-defibrilamentos.
Figura 10: Sistema de
amplificação inicial em um EEG, devidamente protegido
Figura 10: Sistema de
amplificação inicial em um EEG, devidamente protegido. Créditos: Fonte 2
5.2.3 EMG:
Utilizados normalmente com o
intuito de investigar performance muscular, doenças neuromusculares ou então
desenvolvimento de próteses inteligentes, requerem quase sempre circuitos de
pós-processamento.
5.2.4 EOG:
Além de alto ganho, o
amplificador deve possuir boa resposta frente a baixas frequências ou até mesmo
sinal DC. Problema de deriva na característica eletrônica do circuito deve ser
considerado.
5.3 Melhorias no Circuito
Os amplificadores de
biopotenciais juntamente com um projeto adequado são suficientes para uma boa
aquisição de sinal normalmente. Porém, para aplicações inusitadas são
necessários tipicamente outros refinamentos para: redução de interferência
elétrica, filtragem de ruído e redução de erros de medida, isolamento elétrico
do amplificador e proteção anti-defibrilamento.
5.3.1 Redução de Interferência
Elétrica:
Interferência elétrica está
sempre presente, devido à rede dentre outros, e é interessante reduzi-la no
sistema sonda-instrumento-pessoa através do aterramento da pessoa e do
instrumento. Interferência induzida no corpo através dos eletrodos é chamada de
taxa de interferência de modo comum. Pode ser evitada com um amplificador
instrumental ou diferencial com alto CMRR (common mode rejection ratio). A
sonda da perna direita é convencionada como terra (caso do ECG),
inteligentemente se utiliza o princípio de realimentá-la com o modo comum
recebido pelo sinal obtido no primeiro estágio, amplificado e invertido. O que
reduz o modo comum de interferência para
Tensão de interferência
Tensão de Interferência
Isso, juntamente com um CMRR do
amplificador e filtragens permitem boa qualidade medida de biopotenciais.
5.3.2 Filtragem:
Além desses cuidados, é interessante
filtrar no extremo da sonda reduzindo a largura de banda medida. Pequenos
indutores ou contas de ferrita nos fios da sonda ajudam a bloquear
interferência de frequências muito altas. Pequenos capacitores entre cada sonda
e o terra filtram as RF. O uso de passa-altas nos primeiros estágios de
amplificação são recomendados para evitar os potenciais DC provocados pela pele
que poderiam saturar a amplificação (tendo cuidado com o potencial a ser
medido). Passa-baixas em vários estágios de amplificação são recomendados, para
atenuar a interferência RF e sinais dos músculos. Interferências da rede a 50
ou 60 Hz e seus harmônicos são um problema central. Uma alternativa é filtrar
especificamente essas frequências, o que pode não comprometer medidas de sinal
de baixa frequência como EEG e EOG, mas pode ser altamente deletério para
medidas com sinal nessa faixa de frequências, portanto a filtragem deve ser
usada com critério.
5.3.3 Redução de distorções na
medida:
Uma das principais fontes de erro
de medida é o potencial de interface eletrodo-pele. Mudanças lentas de patamar
podem ser causadas por variações nesse potencial de junção e então, em algumas
situações, saturar o amplificador. Movimentação poder causar distorções na
medida, detectáveis de pronto, que seriam evitados por filtragens, mas como
vimos esse filtros tipicamente passa-altas podem também prejudicar a medida. O
que pode ser eventualmente solucionado via software com um pós-processamento do
sinal. Certamente, as fontes de distorções em um caso podem ser desejadas em
outros, como por exemplo o erro causado pelo piscar dos olhos em um EOG pode
ser altamente desejado em um EEG. O próprio sinal do EMG, que é o que se deseja
quando se faz essa medida, deve ser suprimido em todos os outros.
5.3.4 Isolamento Elétrico:
Isolamento elétrico evita a
passagem de corrente de fuga do instrumento para o paciente. Sinais elétricos,
corrente de fuga, de dispositivos atrelados ao paciente e ligados ao terra
devem ser, em contrapartida, evitados de serem transmitidos para o paciente.
Essa passagem pode ser fatal se for diretamente ligada ao coração. O isolamento
pode ser feito eletricamente introduzindo um transformador no meio do caminho
do sinal ou opticamente introduzindo um acoplador óptico.
Como o modo primário e o
secundário do transformador estão eletricamente isolados, não há caminho direto
para o terra. O problema é que o transformador é um dispositivo de alta
frequência, portanto uma solução pode ser modular o biopotencial por uma onda
de alta frequência. Uma alternativa é utilizar um isolamento óptico, com a
conversão do sinal do amplificador em luz por um LED. Esse sinal óptico é
modulado em proporção ao sinal elétrico e enviado ao detector. Um fotodetector
então capta esse sinal luminoso e converte novamente em elétrico, que é
demodulado para reobter o sinal original. O sinal óptico é tipicamente
pulso-modulado para envolver a não-linearidade envolvida pela combinação
LED-fototransistor.
5.3.5 Proteção de Defibrilamento:
Altas voltagens como, por
exemplo, os sinais de defibriladores podem ser enviadas ao detector danificando
o mesmo. Para regular a corrente recebida resistores podem ser usados, para
altas voltagens diodos e diodos Zener podem ser soluções. Como sinais de mais
alta voltagem normalmente devem ser evitados, tubos de descarga de gás de baixa
pressão como neon são utilizados, estes descarregam a tensões de 100 V e
fornecem uma via alternativa para o terra. Os componentes de isolamento devem
ser protegidos por um interruptor de faísca.
6. Práticas de Medida
Medições de biopotenciais
consistem principalmente de boas e factíveis amplificações. Isso, em conjunto
com bons eletrodos e aplicação dos mesmos, além de boas práticas de medida,
garantem uma boa medição.
6.1 Uso de Eletrodos
O uso ponderado de eletrodos de
acordo com cada situação deve ser considerado: mais seguros (mais fortes e
menos irritantes adesivos), mais condutores (de metais nobres), de menos
susceptibilidade a erros de medida (de prata). O gel do eletrodo pode ser de
fundamental importância para manter uma alta qualidade de interface entre a
pele e o eletrodo. Gel de alta condutividade pode ajudar a medição nos
eletrodos, mas pode ser bastante irritante também. Movimentos podem modificar o
potencial de junção causando distorções na medida, posicionamento de eletrodos
em cima de regiões ósseas com menor massa muscular evitam interferência de
sinal EMG e distorções de movimento. Em alguns casos, como no EEG, devem ser
grudados à pele.
6.2 Preparação da Pele
O potencial existente na
superfície da pele, atribuído à superfície das células do tecido epidérmico,
causam um alto sinal DC e podem ser extremamente prejudiciais à medida, como
por exemplo no sinal do EOG (de baixa frequência). Qualquer perturbação na pele
pode modificar esse potencial. Glândulas sudoríparas podem prejudicar a medida
também. A abrasão da pele pode reduzir esses efeitos, como alguns métodos de
lixamento. Uma alternativa menos violenta e eficaz é a passagem de um cotonete
com álcool na pele. Como sinais baixos são medidos, a resistência da pele deve
ser reduzida a algo abaixo dos 2 kΩ. Obviamente a redução de movimentos e de
atividade muscular auxilia também.
6.3 Redução de Interferência
Ambiental
Radiação eletromagnética da rede,
RF produzidas pelas máquinas, campo magnético induzido nas sondas e potencial
elétrico induzido no corpo interferem na medida. Blindagem dos amplificadores
dos eletrodos e até da pessoa podem ser muito eficazes para reduzir sinais
induzidos. A blindagem dos eletrodos pode ser feita enrolando-os juntamente.
O próprio amplificador deve
possuir filtros de radiações eletromagnéticas indesejadas ao longo de sua
construção. Altas frequências podem ser filtradas utilizando estranguladores ou
indutores no extremo da sonda. Interferência eletrostática pode ser evitada
aterrando o instrumento. O caráter CMRR do amplificador é essencial para
reduzir e interferência de modo comum causada pela corrente induzida no corpo
devido às interferências elétricas do ambiente. Esse efeito pode ser ainda mais
reduzido pelo uso do método da perna direita (referência), descrito
anteriormente.
7. Estado da Arte
A ciência e os princípios básicos
da tecnologia para medição de EEG são os mesmos desde que surgiu há quase 1
século (1929), mas a tecnologia empregada nos circuitos, nos processos e nos
materiais permite medidas cada vez mais refinadas e de melhor conteúdo. É um
biopotencial mais sutil que os outros devido à composição do crânio, e portanto
mais complexo de medir.
Portanto, o estado da arte na
medição de biopotenciais se apresenta para eletroencefalograma. Diversos
cuidados devem ser tomados e um projeto integrando diversas etapas na medição
deve ser pensado. O eletrodo, bem como os terminais de entrada, é muito
importante e escolher o material adequado pode ser essencial. Eletrodos podem
ser produzidos em diferentes geometrias. Como discos ou copos, ou então
internos, como agulhas, com fios de aço inoxidável ou platina e para
utilizações clínicas mais específicas.
Existe um material na interface
do eletrodo com a pele, em forma de gel ou pasta, um eletrólito para aumentar a
condução. O biopotencial se manifesta através de uma corrente que flui do
material extracelular e do tecido até a sonda.
Em eletrodos com formato de copo
há bastante volume para a contensão de eletrólito, nessa geometria o eletrodo
nunca toca a pele. A impedância depende de muitos fatores, como cama de
interface do eletrodo, área de superfície do mesmo, temperatura do eletrólito,
dentre outros. O contato eletrodo-pele tem propriedades resistivas e também
capacitivas, que vão interferir na dependência com a frequência.
O contanto eletrodo-eletrólito
faz com que íons se acumulem em placas na interface produzindo o potencial de
meia-célula (o que pode fazer com que a tolerância do amplificador tenha que
ser maior), descrito pela equação de Nernst:
Equação de Nenstr Alternativa
onde ɛ é o potencial de
meia-célula, ne são os elétrons transportados (número de mols) e Q é a razão de
íon de dentro pelos de fora.
O sistema 10/20 é um sistema de
posicionamento de eletrodos padrão e muito utilizado. Existem 75 localizações
nesse sistema, mas 8 a 32 eletrodos já são suficientes para algumas aplicações
de interface computador cérebro (BCI), mas não para imageamento de fonte
elétrica (ESI) em que mais de 100 eletrodos são necessários, lobos frontais,
parietais, oscitais, temporais e outros. Existem configurações de até 345
eletrodos, mas não são muito comuns.
Adquirir sinais biopotenciais
adequadamente significa principalmente segurança e alta razão sinal-ruído
(SNR), sem perda de dados. A seguir estão descritas as sugestões para se
atingir medidas de maior refinamento e eficácia, ou o estado da arte em medição
de biopotenciais, veremos que elas não são absolutamente genéricas e algumas só
contribuem em conformidade com o projeto desenvolvido, são elas:
A - Segurança do
paciente/amostra: Devido à corrente de fuga no sistema e defibriladores (quando
usados), a segurança do paciente é necessária, para isso o terminal de entrada
do circuito do paciente e o terra devem ser separados. Aumentar a razão
rejeição de modo de isolamento só amplificador reduz a influência da tensão
modo de isolamento.
B – Proteção de EMI: A utilização
de dispositivos eletro-eletrônicos e lâmpadas fluorescentes causa interferência
EM e deve ser evitado, pois distorce o sinal de EEG e corrompe-o com ruído. O
amplificador de instrumentação ameniza esse problema.
C – Ausência de movimentos do
paciente: Movimento musculares como piscar de olhos e movimentos de perna
prejudicam seriamente a medida, pois produzem outros potenciais. E isso pode
prejudicar a interpretação desses sinais.
D – Proteção de ESD: Componentes
eletrônicos ativos devem possuir proteção a descargas eletrostáticas de pelo
menos 2 kV, ou então o paciente pode se ferir e/ou o equipamento sofrer
danificações.
E – Aterramento adequado: Caixas
de metal devem ser conectadas a placas ou hastes de metal enterradas na terra.
Isso aumenta a razão sinal-ruído pois diminui ruídos.
F – Eletrodos: escolher material
e montagem adequados é essencial e deve ser considerado de acordo com a
aplicação. Além de eletrodos ativos, eletrodos DC acoplados ou eletrodos
“secos” podem ser usados. O número e o posicionamento desses eletrodos também é
importante.
Figura 11: Eletrodos ativos,
possuem um sistema de amplificação junto ao eletrodo
Figura 11: Eletrodos ativos,
possuem um sistema de amplificação junto ao eletrodo. Créditos: Fonte 2
G – Impedância de contato do
eletrodo: A impedância deve estar entre 1 kΩ, abaixo disso distorções no sinal
são provocadas, e 10 kΩ, acima disso curto entre eletrodos são causados. A
impedância deve ser medida antes da medição e o sinal do EEG deve ser
acompanhado. Com a tecnologia atual, utilizando chips amplificadores de impedância
de entrada da ordem de 1 GΩ ou a abordagem de eletrodos ativos, a impedância de
contato perde em importância. Evidentemente, os eletrodos não devem ser
movidos.
H – Imunidade a Ruídos: Técnicas
de redução de ruídos devem ser consideradas e impressas no desenvolvimento da
placa. Cartões eletrônicos e cabos de conexão devem ser colocados em caixas
metálicas para reduzir ao máximo os ruídos. Cabos torcidos e misturados dão
bons resultados. Como sinais de EEG são da ordem de microvolts, eles são muito
sensíveis a ruídos, que não devem passar dos 2 microvolts pico-a-pico.
I – Condições ambientais: O
sistema deve ser o mais indiferente possível a intervenções externas, por
exemplo blindagem para campos magnéticos intensos se for utilizado em
simultâneo com um exame de RMN, ou então imune a interferência de campos
elétricos fortes durante uma cirurgia com eletro-cauterização em que o paciente
deve ter sua atividade cerebral monitorada. Deve ser independente a temperatura
do ambiente também.
J – Redução de sinais de modo
comum: Devem ser utilizados amplificadores de instrumentação com CMRR acima dos
80 dB para boa SNR.
K – Modo de armazenamento: O
usuário deve poder utilizar o medidor de acordo com seu interesse e decidir
como a informação é gravada: unipolar (referência comum), bipolar (uma
referência para cada) ou uma referência média.
L – Referência e posicionamento
do eletrodo terra: Esses posicionamentos são importantes e normalmente a
referência é localizada no topo da cabeça e o terra no(s) lóbulo(s) da(s)
orelha(s).
M – Manutenção da originalidade
do sinal: Amplificadores com resposta linear e sem distorções devem ser
utilizados, ou então a performance pode cair.
N – Evitando Saturação do
Amplificador: Se o amplificador satura, a perda de sinal analógico é
inevitável. Saturação é causada principalmente por alto sinal de entrada devido
a movimentações. Na amplificação, amplificadores que usem filtro passa-alta
devem ser ajustados para um ganho ótimo para evitar nível de saturação. Já para
DC esse risco de saturação não ocorre, porém o número de bits efetivos de
resolução cai.
O – Rejeição de Conversa Cruzada:
Em medidores de mais de um canal, rejeição de interferência entre eles deve ser
alta.
P – Impedância de Entrada:
Impedância de entrada deve ser grande o suficiente. Para sinais DC, valores
acima de 1 GΩ dão bons resultados. Baixos valores de impedância carregam o
sinal e causam distorções.
Q – Corrente de tendência de
entrada: Correntes de entrada do amplificador devem ser o mais baixas possível
(pA), ou então carregam os biopotenciais e também podem causar distorções no
sinal.
R – Banda de Frequências:
Escolher o filtro adequado de frequências (banda deve ir ao menos de 0.5 Hz a
70 Hz) é importante também para digitalização e armazenamento de dados. Taxa de
amostragem (>140 Hz) e de transferência também deve ser garantido. Nível DC
deve ser removido para bom processamento em software e hardware.
S – Digitalização: Suficiente (e
ótima) resolução digital (>10 bits para amplificação AC e >20 bits para
DC) deve ser disponibilizado para o conversor ADC. Se baixa resolução for
utilizada, erros de quantização aumentam.
T – Mesmos Instantes de
Amostragem: Se um sistema multicanais é projetado e/ou utilizado, não deve
haver tempo de atraso entre eles. Para um multiplicador analógico isso deve ser
um problema, mas para um digital, não. Para amostrar em um mesmo instante de
tempo, circuitos de espera e amostragem devem ser usados. Se cada um possuir
seu próprio ADC, isso pode ser feito com controle de tempo de ADC.
U – Tempo de armazenamento:
Suficiente (e ótimo) tempo de armazenamento é requerido. Longos tempos de
aquisição (mais de 2 horas) causam secamento do eletrólito, transpiração e
ansiedade no paciente, prejudicando a medida. Porém curtos tempos de aquisição
podem causar aquisição insuficiente de dados.
V – User Friendly: O sistema de
hardware e software devem ser bem integrados e “usuário-amigáveis”.
W – Baixo Consumo de Energia:
Importante especialmente para sistemas com bateria.
X – Baixo Custo: O sistema deve
ser de eficiente em custo, e o componentes devem ser disponibilizáveis.
Figura 12: Medição de um
Biopotencial com alguns cuidados em termos de eletrônica evidenciados para que
a medida seja mais adequada.
Figura 12: Medição de um
Biopotencial com alguns cuidados em termos de eletrônica evidenciados para que
a medida seja mais adequada. Créditos: Fonte 2
8. Conclusão
O princípio básico para a
obtenção de sinais biopotenciais é o mesmo desde os seus primórdios, o que muda
para que se atinja um estágio de sofisticação, o que proporciona uma riqueza
maior de detalhes e melhor compreensão do corpo, de medida são as soluções de
engenharia. Está claro que em um projeto devem ser considerados diversos
parâmetros para se obter um sinal aceitável, sem ruídos e distorções, desde
cuidados com a escolha do material do eletrodo até o momento da aplicação do
exame, passando pelo desenvolvimento de um amplificador de instrumentação
adequado.
Tudo isso deve ser pensado de acordo
com o objetivo do medidor em questão, para ECG um sistema eletrônico com bom
tempo de recuperação pode ser fundamental, para um EMG a filtragem de baixas
frequências é importante para um sinal limpo, já o EOG ao contrário deve
possuir boa resposta DC. O eletroencefalografia como sinal mais sutil, complexo
e rico em informação é o que deve confluir harmonicamente uma série de cuidados
com a medida, descritos acima, para que se possa extrair sem distorções e
ruídos a maior quantidade de informação sobre a atividade cerebral.
9. Referências
Conteúdo e Imagens:
Webster, John et al. Measurement, Instrumentation and
Sensors Handbook. Boca Raton, Florida: CRC Press LLC. 2000.
Ali Bulent Usakli, “Improvement of EEG Signal
Acquisition: An Electrical Aspect for State of the Art of Front End,”
Computational Intelligence and Neuroscience, vol. 2010, Article ID 630649, 7
pages, 2010. doi:10.1155/2010/630649
Quillfeldt, Jorge A. Origem dos
Potenciais Elétricos das Células Nervosas. Departamento de Biofísica da UFRGS
(em aberto)
Imagens:
4.
http://www.academiamedica.com.br/wp-content/uploads/eletrocardiograma.jpg
5.
https://www.adinstruments.com/sites/default/files/images/rcexp_Intramuscular-EMG.jpg
6.
http://wg11.sc29.org/mpeg-v/wp-content/uploads/2012/09/eog.png
630649.fig.001.jpg - Figura 6:
Ilustração da região de contato entre eletrodo e a pele e a eletrônica
envolvida (18,8 KB) Leonardo Alves, 28/05/2013 08:58
630649.fig.003d.jpg - Figura 7:
Colocação de sondas desse tipo em exames de EEG (18,4 KB) Leonardo Alves,
28/05/2013 08:58
630649.fig.004.jpg - Figura 8:
Estrutura de um eletrodo de polímero adesivo (23,4 KB) Leonardo Alves,
28/05/2013 08:58
630649.fig.005a.jpg - Figura 9:
Conexão entre eletrodo e amplificador diferencial (esquemático) (14,1 KB)
Leonardo Alves, 28/05/2013 08:58
eletrocardiograma.jpg - Figura 1:
Sinal característico de um ECG, com alguns processos biológicos associados
(32,8 KB) Leonardo Alves, 28/05/2013 08:58
ECGcolor.svg.png - Figura 2:
Sistema padrão de disposição de sondas para medição de ECG (60,7 KB) Leonardo
Alves, 28/05/2013 08:58
Brain_TaskMap_en.PNG - © 2007 .. 2008
Soft-dynamics.de (108,6 KB) Leonardo Alves, 28/05/2013 08:58
rcexp_Intramuscular-EMG.jpg -
Figura 4: Ilustração de uma maneira típica de obter EMG (70,8 KB) Leonardo
Alves, 28/05/2013 08:58
630649.fig.005c.jpg - Figura 10:
Sistema de amplificação inicial em um EEG, devidamente protegido (12,3 KB)
Leonardo Alves, 28/05/2013 08:58
eog.png - Figura 5: Mapeamento da
diposição d eletrodos na face para um exame de EOG (36,2 KB) Leonardo Alves,
28/05/2013 08:58
630649.fig.003b.jpg - Figura 11:
Eletrodos ativos, possuem um sistema de amplificação junto ao eletrodo (11,8
KB) Leonardo Alves, 28/05/2013 09:07
630649.fig.006.jpg - Figura 12:
Medição de um Biopotencial com alguns cuidados em termos de eletrônica
evidenciados para que a medida seja mais adequada. (23,1 KB) Leonardo Alves,
28/05/2013 09:07
eq1.png - Equação de Nernst (1,7
KB) Leonardo Alves, 04/06/2013 00:16
eq2.png - Equação de GHK (3,7 KB)
Leonardo Alves, 04/06/2013 00:16
eq3.png - Tensão de interferência
(1,4 KB) Leonardo Alves, 04/06/2013 00:16
eq4.png - Equação de Nenstr
Alternativa (1,4 KB) Leonardo Alves, 04/06/2013 00:16
Fonte:
http://cta.if.ufrgs.br/projects/instrumentacao-fisica/wiki/Medi%C3%A7%C3%A3o_de_Biopotenciais_-_o_Estado_da_Arte
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